Indígenas ocupam fazenda e pedem fim da pulverização de agrotóxicos sobre comunidade em MS
26/09/2025
(Foto: Reprodução) Indígenas Guarani e Kaiowá retomam área de fazenda em Caarapó
Indígenas Guarani e Kaiowá retomaram a área de uma fazenda que, segundo o Conselho Indigenista Missionário (Cimi), sobrepõe a Terra Indígena Guyraroká, em Caarapó (MS) (veja vídeo acima).
Eles reivindicam o fim da pulverização de agrotóxicos sobre a aldeia onde vivem e a demarcação da Terra Indígena. Conforme o conselho, os indígenas ocuparam a fazenda Ipuitã no último domingo (21) e seguem no local ainda nesta sexta-feira (26).
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No vídeo, registrado na quinta-feira (25) no local da retomada, uma indígena relata a situação dos integrantes que fazem a ocupação. Cerca de 80 indígenas estão na retomada.
“Eles estão todos ali na fazenda, queimaram tudo o que tinha. Aqui está a comunidade. Pessoal está rezando por quem passou mal. Teve mulher grávida que tomou tiro e está desmaiada e não tem Sesai para socorrer. É por nossa terra que estamos passando por isso. Estamos cansados de esperar, já reclamamos tanto, chegamos até na ONU e ninguém resolveu. Aqui nós estamos pela nossa terra, por nosso povo Guarani e Kaiowá. Fazendo assim para que possam olhar para o nosso povo e demarcar a nossa terra”, diz a indígena no vídeo.
➡️A fala da indígena no vídeo, feita em Guarani, foi traduzida por Simão Guarani e Kaiowá.
Conforme o Cimi, a Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH), foi acionada e os indígenas pedem que a Corte internacional acelere os processos judiciais que envolvem a demarcação da Terra Indígena Guyraroká, já que a medida pode ser a “única capaz de solucionar o problema definitivamente e garantir a sobrevivência física e cultural da comunidade”, publicou o conselho.
O g1 não conseguiu localizar o contato da administração da Fazenda Iputiã até a última atualização desta reportagem. Também não obtivemos retorno da Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai).
O Ministério dos Povos Indígenas informou que acompanha a situação e que uma força-tarefa será criada para traçar estratégias que garantam e respeitem os direitos dos territórios dos povos indígenas. Integrantes da pasta se reuniram com autoridades do governo estadual, incluindo o governador Eduardo Riedel, para discutir a situação, sobretudo, da violência enfrentada pelos Guarani e Kaiowá.
Caso internacional
Em 2019, a Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH), órgão que faz parte da Organização dos Estados Americanos (OEA), concedeu uma medida (ainda vigente) que exige do Estado brasileiro medidas para proteger o direito à vida e à integridade pessoal do povo Guarani e Kaiowá da comunidade Guyraroká.
Na ocasião, a corte internacional considerou que os indígenas vivem sob situação de risco devido às constantes ameaças, abusos e atos de violência “supostamente por parte de fazendeiros no marco de uma controvérsia propriedade de terras”.
Demarcação
Conforme consta no relatório da Comissão Internacional, em 2009 o Estado brasileiro reconheceu que as terras onde a fazenda está inserida pertencem aos indígenas. Contudo, em 2016, a decisão foi revertida e o processo segue no Supremo Tribunal Federal (STF). Os Guarani Kaiowá buscam a retomada da terra desde 1999.
No documento é evidenciado que, entre os problemas enfrentados pelos indígenas está o uso de agrotóxicos lançados nas plantações, casas, escola e posto de saúde da comunidade.
“Apesar de Guyraroká ser uma terra já declarada, com 11 mil hectares, mas os indígenas [cerca de 200] vivem em 50 hectares, num acampamento provisório, sem mínimas condições de dignidade”, explica ao g1, Matias Benno, coordenador do Cimi Regional Mato Grosso do Sul.
Na última terça-feira (23), uma carta enviada a CIDH informa a comissão que a comunidade indígena sofre, ainda, com a contaminação de suas terras e água e que a “situação de insegurança alimentar” pode se agravar, já que as plantações são atingidas pela pulverização de agrotóxicos.
Um estudo, publicado na Associação Brasileira de Saúde Coletiva da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) avaliou a presença de agrotóxicos nas águas da retomada Guyraroká e encontrou mais de 20 substâncias que causam "efeitos graves à saúde e 68% são proibidos na União Eruopeia", aponta a publicação.
"Os resultados revelam que essas comunidades estão expostas aos agrotóxicos, violando seus direitos à saúde e à soberania alimentar", diz o estudo.
Uso das forças de segurança
No último domingo (21), os indígenas chegaram a ser retirados da retomada, segundo informou o Cimi. Na carta enviada à Comissão Internacional, o conselho relata que o despejo foi feito pela Polícia Militar de Mato Grosso do Sul sem ordem judicial.
"A comunidade foi despejada a primeira vez [domingo] na ausência da Funai, na ausência da força nacional. A tropa de choque os despejou há dois dias atrás, eles ficaram esperando porque eles disseram paro Estado que o fazendeiro sinalize que não vai plantar, porque se ele plantar, ele vai envenenar [a comunidade indígena]", finaliza Matias Benno.
O g1 entrou em contato com a Secretaria de justiçã e Segurança Pública de Mato Grosso do Sul (Sejusp). A pasta disse que "a polícia agiu em estrito cumprimento de seu dever legal, prezando pela salvaguarda de vidas e a proteção da sociedade".
Indígenas Guarani e Kaiowá pedem fim da pulverização de agrotóxicos em Caarapó (MS).
Divulgação/Cimi
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